A meditação e a busca pelo autoconhecimento entraram na vida de Gabriel Kallas, co-fundador da Toro Investimentos, para ficar. Desde 2013, ela se tornou uma rotina essencial ao seu dia a dia. E o mais curioso: em um momento no qual tudo parecia desmoronar, com problemas de produtividade, para dormir, insucessos e insatisfação com o negócio e com a vida de forma mais ampla – situações que todo grande empreendedor já enfrentou em algum momento de sua trajetória.
“Foi a oportunidade para aprofundar a minha visão sobre o autoconhecimento e se tornou a parte mais importante da minha vida. Sou desapegado de religião, mas comecei a estudar o que Jesus Cristo, Buda e até mesmo Einstein, que tem insights muito legais, falavam”, relata. “Isso foi um divisor de águas, e essa espiritualidade passou a ser algo muito importante para mim. Espiritualidade no sentido de uma conexão comigo mesmo, de forma profunda”, diz.
Essa percepção ganhou ainda mais sentido depois da leitura do livro “O Poder do Agora”, de Eckhart Tolle. “Em 2013, quando eu vi tudo de importante desabando, as reflexões me fizeram entender o que eu sou e o que eu não sou, sem projetar identidade naquilo que temos ou em outras pessoas”, acrescenta.
Desde então, a meditação integra o seu cotidiano e de muitos diretores e colaboradores – dos cerca de 200 – da Toro Investimentos. Não por imposição, mas por interesse. “Hoje, vários dos colaboradores meditam”, conta. Ao contrário do que se imagina, as práticas acontecem não só na tranquilidade de sua residência ou de um quarto de hotel, no início do dia ou antes de dormir, mas até mesmo em meio às reuniões ou apresentações, quando busca se conectar e estar mais presente.
Com a meditação, Kallas diz ter colhido vários benefícios: voltou a dormir bem, passou a se cuidar mais, a buscar relacionamentos mais verdadeiros e aprendizado constante, desligando-se das “turbulências” e voltando para o eixo, sempre que necessário.
Propósitos e compartilhamento
Se voltasse no tempo e pudesse dar dicas ao seu eu mais jovem, Kallas divide esses conselhos em três partes:
– Encontrar um propósito – Algo que mova as pessoas e, no caso de uma empresa, que seja um propósito compartilhado. Ele cita o exemplo de algumas marcas que foram capazes de extrapolar os seus objetivos, caso da Apple, com o slogan “Pense Diferente”, ou da Nike, com o “Simplesmente Faça”. Esses propósitos se tornaram mais do que meras palavras. “Eles trazem verdades que transcendem a empresa. Vai dar força para ser inabalável nos momentos em que tudo a sua volta está desabando”, analisa.
– O propósito não pode ser egoísta – Kallas usa uma metáfora para explicar o seu raciocínio: uma motivação egoísta é como colocar óleo de cozinha em uma Ferrari: ela pode até funcionar, mas vai parar no primeiro morro que aparecer. “Meu objetivo no início era ficar rico e foi mudando para algo que pode ser compartilhado por mim, pela minha família, pelos colaboradores, pelos meus sócios e clientes”, diz.
– A criação de uma cultura de compartilhamento – Uma empresa depende de sua cultura: um acordo de valores entre as pessoas. É a união de inteligência dessas pessoas que vai construir soluções e inovação, além de atrair, reter e alinhar as pessoas aos propósitos do negócio. “A capacidade de criar vem das pessoas. Quando elas transcendem objetivos individuais, a empresa sai do lugar. Há troca do motor do ego pelo da colaboração”, diz.
Estar presente de fato
Com atuação em um universo de muita pressão, como o financeiro, Gabriel Kallas afirma que a meditação auxilia a agir e estar no presente, sem negligenciar o futuro ou remoer o passado. “Nós somos pressionados a estar preocupados com o futuro ou lembrando do passado. Mas nós vivemos o presente”, reforça.
O mercado financeiro talvez seja um dos mais exigentes e concorridos do mundo corporativo – a Toro Investimentos se orgulha de ter ajudado mais de 1 milhão de pessoas a aprender a investir e foi considerada no ano passado uma das 12 fintechs de investimentos mais promissoras do mundo pela CBInsights. A paz e a serenidade da meditação contrastam com esse mundo, mas, ao mesmo tempo, trazem consciência e capacidade de enxergar além dos sentimentos – especialmente quando envolve a parte financeira.
“Tomar boas decisões e conseguir construir algo transformador depende de ser capaz de enxergar além de um mundo barulhento e complicado, no qual todos estamos imersos. Não é só enxergar: mas ver o que realmente importa”, conta.
Para Kallas, no mercado financeiro, muitas das decisões são contaminadas pela emoção e, por esse motivo, nem sempre são as mais serenas ou inteligentes. “O mercado corporativo e a sociedade aprendeu a ser movido pelo medo e pela ganância, combustíveis traiçoeiros e que levam a uma carga emocional muito grande”.
Nesse raciocínio, o medo faz com que muitos se mantenham presos a uma zona de conforto, sem conseguir evoluir ou compreender o melhor momento para encerrar um investimento, e a ganância impede de ter uma visão de longo prazo, o que faz com que estejam fechados para um mercado cíclico, que beneficia àqueles com mais paciência.